sábado, 30 de dezembro de 2017

A sabedoria dos contos de fadas


Armindo Teixeira Mesquita


UTAD (Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Portugal) e Presidente do OBLIJ (Observatório da Literatura Infanto-Juvenil)

Introdução

Sempre que se conta um conto de fadas, a noite vem. Não importa o lugar, não importa a hora, não importa a estação do ano, o fato de uma história estar sendo contada faz com que um céu estrelado e uma lua branca entrem sorrateiros pelo beiral e fiquem pairando acima da cabeça dos ouvintes.

Clarissa Pinkola Estes
               

A arte de contar histórias é remota
1. Encontramo-la em todas as partes do mundo. Aliás, nos velhos tempos, as pessoas do povo sentavam-se, sobretudo aos serões, à volta da fogueira para descansar do árduo trabalho diário, para conversar e para contar histórias
Sabe-se como é importante para a formação da personalidade da criança ouvir muitas e belas histórias. Pois, escutar histórias é uma das primeiras experiências literárias do ser humano. Quando a criança escuta um conto, a sua mente está a produzir outro. Isto vem reforçar a ideia de que, por um lado, a narrativa oral opera como um veículo de emoções e, por outro lado, inicia a criança na palavra, no ritmo, nos símbolos, na memória, desperta a sensibilidade, conduzindo à imaginação através da linguagem global. Neste sentido, a literatura apresenta-se como meio de manifestação de cultura.
Durante séculos, a aprendizagem fazia-se através da transmissão oral, porque não havia livros, nem a infância era concebida como hoje. Os valores, os costumes e as regras sociais eram transmitidos, graças aos mitos, aos contos e a outras formas de comunicação oral.
Com o aparecimento da imprensa, em meados do século XV, criou-se um novo mundo simbólico e uma nova tradição: a leitura, já que os jornais e os livros tornaram-se os grandes agentes culturais dos povos. As fogueiras foram ficando para trás. Os velhos contadores de histórias foram sendo esquecidos. No entanto, as histórias continuam associadas à nossa cultura, através dos livros e das suaves vozes das mães e das avós, para encantamento das crianças.
O conto de fadas (literário) surgiu na Europa da Idade Moderna como tradição oral levada ao público infantil. As histórias eram contadas de um adulto para uma criança, registando lições, experiências, em que geralmente os heróis superavam situações desfavoráveis através de algum segredo mágico. Por se tratar de narrações fictícias, as acções dos contos de fadas desenrolam-se em países imaginários, povoados por objectos e personagens mágicos e estranhos, onde o narrador e o seu público não acreditam na realidade da história.
A grande aceitação do conto de fadas teve, pelo menos, duas consequências importantes sobre a evolução da literatura infantil. Em primeiro lugar, impôs o predomínio do lúdico sobre o instrutivo. Em segundo, contribuiu para a definição de um género especificamente voltado para as crianças.





Porquê contar contos de fadas às crianças?

Pessoas de diferentes idades conhecem e encantam-se com os contos de fadas. Plenos de significados, com estrutura simples, histórias claras e personagens bem definidas nas suas características pessoais (facilitando a identificação delas em bom ou mau, bonito ou feio, forte ou fraco, rico ou pobre, etc.), atingem a mente da criança, entretendo-a e estimulando a sua imaginação, como nenhum outro tipo de literatura talvez seja capaz de fazer. As crianças gostam muito dos contos de fadas, recomendados geralmente a partir dos 4 ou 5 anos.
Embora distantes das narrativas originais, os contos de fadas continuam vivos, povoando a imaginação infantil e alimentando o seu espírito. Ao mesmo tempo que os contos podem auxiliar a criança a superar conflitos, que são inerentes ao seu processo de desenvolvimento, constroem um sistema metafórico e simbólico. Através do tempo, os contos de fadas mantêm o seu poder transformador e a sua magia. Magia que se revela não só na sua narrativa, como também nas transformações que desencadeia naquele que escuta ou naquele que narra um conto. Aliás, a magia de um conto encontra-se no seu acto de contar:
O ritual que se exige, os silêncios que se ouvem, o cenário que nos envolve, a forma do olhar, a expressividade das mãos são elementos indispensáveis a essa vivência profundamente solidária que é o contar/ouvir um conto. A voz que veicula a história tem uma importância fundamental; não só ela, mas também a postura física do contador constitui uma peça a ter em conta. Esta atmosfera mágica indispensável toca profundamente o(s) ouvinte(s)».

(Veloso, 1994:45)
               



As crianças bebem as palavras que saem da boca do contador. Para isso, é preciso haver uma cumplicidade entre a criança e o narrador.
Um dos prazeres do conto é precisamente a eliminação das fronteiras entre o (mundo) possível e o (mundo) impossível, entre o real e o imaginário. Guiados pela mágica expressão inicial: «Era uma vez...»; crianças e adultos soltam as amarras para embarcarem, de imediato, no imaginário, numa aventura simbólica na companhia de muitas personagens que, embora sejam da ficção, parecem familiares. Tal como acontece com as crianças, as personagens vivem grandes emoções que podem ser compartilhadas. Parafraseando Bettelheim, a criança compreende intuitivamente que sendo irreais, estas histórias são verdadeiras; os feitos que narram não existem na realidade, mas estão presentes como experiência interior.
As crianças entram ainda muito facilmente nesse mundo imaginário, onde já têm um pé, porque todos os dias inventam histórias extraordinárias nas quais elas próprias são os heróis. Fazem falar os objectos, os animais, os brinquedos, etc. Para as crianças, nada é estranho, tudo é lógico. Mais ainda: tudo as fascina.
Os adultos encontram também, nestas narrações, o eco do seu mundo interior e dos seus sonhos. Por isso, não é difícil deixar-se levar pela história, em que o aspecto das aventuras fantásticas e as intrigas os cativa. Toda a gente se vê reflectida e cada um pode encontrar, nos contos, o que quer e o que necessita, de acordo com as suas preocupações.
As personagens são muito descritas, ao ponto de podermos entrar na sua pele, de viver as suas experiências. Elas são boas ou más, nunca ambas as coisas ao mesmo tempo como pode acontecer nos seres humanos da vida real. Por exemplo, uma irmã é honrada e trabalhadora, enquanto que as outras são malvadas e preguiçosas. Uma é formosa e as outras são feias. Um dos pais é bom o outro é mau.
Ao apresentar caracteres totalmente opostos, não pretendem provocar uma conduta adequada, mas ajudar a compreender, mais facilmente, as diferenças entre ambos (por um lado assim funciona a mente da criança, polarizando entre bom e mau). A ambiguidade só se estabelece quando já se adquiriu uma personalidade firme sobre a base das identificações positivas.
Por outro lado, a criança não se identifica com o herói bom pela sua bondade, mas porque a sua condição de herói a atrai muito. Aliás, o que mais lhe interessa não é bondade ou a maldade dos intervenientes da história, mas a inteligência do herói que, geralmente, é o ser mais pequeno e mais frágil (tal como a criança) e que, graças ao seu o engenho, consegue vencer o inimigo (com características físicas bem mais fortes do que as suas).
Neste sentido, o conto de fadas é único, é uma obra de arte, por isso, é susceptível de várias interpretações. O significado mais profundo deste tipo de contos será distinto para cada criança (e inclusivamente para a mesma criança) em diferentes períodos da sua vida. O que faz com que um determinado conto seja mais importante do que outro para uma determinada criança e numa idade concreta, depende do seu estado de desenvolvimento psicológico e dos problemas mais estimulantes daquele momento. Os contos de fadas são tão ricos para uma criança de 5 anos como para uma de 12 anos: as suas interpretações não serão, logicamente, as mesmas.

Fonte: www.cervantesvirtual.com

sábado, 23 de dezembro de 2017

Dom Antônio Muniz preside celebrações de Natal

Confira a programação das missas na Catedral e no Santuário Virgem dos Pobres
O arcebispo de Maceió, dom Antônio Muniz, vai presidir a Missa da Vigília de Natal e a celebração do dia no Santuário Arquidiocesano Virgem dos Pobres. No domingo (24), a Missa da Vigília será às 22h e na Solenidade do Natal, no dia 25 de dezembro, às 10h.
"Natal é festa sem fim, é festa da vida. E a melhor forma de celebrar é enxergar o Menino Deus no próximo, ajudando e fazendo o bem, e participar da Ceia do Senhor", afirma o arcebispo. "Quero desejar um santo e feliz Natal ao povo de Deus e que sejamos, hoje e amanhã, instrumento de salvação para que aconteça o Reino de Deus".
Catedral e Igreja São Gonçalo

Às vésperas do Natal, a celebração também acontece às 19h na Catedral Metropolitana, no Centro de Maceió, e às 21h na Igreja São Gonçalo, no bairro do Farol. Na segunda-feira (25), os fiéis podem participar da Missa na Catedral Nossa Senhora dos Prazeres às 17h.

Fonte: www.arquidiocesedemaceio.org.br

quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

A Carta de Pero Vaz de Caminha


A Carta de Pero Vaz de Caminha enviada ao rei D. Manuel sobre a descoberta do Brasil, é o documento no qual Pero Vaz de Caminha registrou as suas impressões sobre a terra que depois viria a ser chamada de Brasil. Esta carta é o primeiro documento escrito da história do Brasil.
Senhor:
Posto que o Capitão-mor desta vossa frota, e assim os outros capitães escrevam a Vossa Alteza a nova do achamento desta vossa terra nova, que ora nesta navegação se achou, não deixarei também de dar disso minha conta a Vossa Alteza, assim como eu melhor puder, ainda que -- para o bem contar e falar -- o saiba pior que todos fazer.

Tome Vossa Alteza, porém, minha ignorância por boa vontade, e creia bem por certo que, para aformosear nem afear, não porei aqui mais do que aquilo que vi e me pareceu.Da marinhagem e singraduras do caminho não darei aqui conta a Vossa Alteza, porque o não saberei fazer, e os pilotos devem ter esse cuidado.
 Portanto, Senhor, do que hei de falar começo e digo:
A partida de Belém, como Vossa Alteza sabe, foi segunda-feira, 9 de março. Sábado, 14 do dito mês, entre as oito e nove horas, nos achamos entre as Canárias, mais perto da Grã- Canária, e ali andamos todo aquele dia em calma, à vista delas, obra de três a quatro léguas. E domingo, 22 do dito mês, às dez horas, pouco mais ou menos, houvemos vista das ilhas de Cabo Verde, ou melhor, da ilha de S. Nicolau, segundo o dito de Pero Escolar, piloto.
Na noite seguinte, haver tempo forte nem contrário para que tal acontecesse. Fez o capitão suas diligências para o achar, a uma e outra parte, mas não apareceu mais!
E assim seguimos nosso caminho, por este mar, de longo, até que, terça-feira das Oitavas de Páscoa, que foram 21 dias de abril, estando da dita Ilha obra de 660 ou 670 léguas, segundo os pilotos diziam, topamos alguns sinais de terra, os quais eram muita quantidade de ervas compridas, a que os mareantes chamam botelho, assim como outras a que dão o nome de rabo-de-asno. E quarta-feira seguinte, pela manhã, topamos aves a que chamam fura-buxos.

Neste dia, a horas de véspera, houvemos vista de terra! Primeiramente dum grande monte, mui alto e redondo; e doutras serras mais baixas ao sul dele; e de terra chã, com grandes arvoredos: ao monte alto o capitão pôs nome - o Monte Pascoal e à terra - a Terra da Vera Cruz.

Mandou lançar o prumo. Acharam vinte e cinco braças; e ao sol posto, obra de seis léguas da terra, surgimos âncoras, em dezenove braças -- ancoragem limpa. Ali permanecemos toda aquela noite. E à quinta-feira, pela manhã, fizemos vela e seguimos em direitos à terra, indo os navios pequenos diante, por dezessete, dezesseis, quinze, catorze, treze, doze, dez e nove braças, até meia légua da terra, onde todos lançamos âncoras em frente à boca de um rio. E chegaríamos a esta ancoragem as dez horas pouco mais ou menos.

Dali avistamos homens que andavam pela praia, obra de sete ou oito, segundo disseram os navios pequenos, por chegarem primeiro.

Então lançamos fora os batéis e esquifes, e vieram logo todos os capitães das naus a esta nau do Capitão-mor, onde falaram entre si.

E o Capitão-mor mandou em terra no batel a Nicolau Coelho para ver aquele rio. E tanto que ele começou de ir para lá, acudiram pela praia homens, quando aos dois, quando aos três, de maneira que, ao chegar o batel à boca do rio, já ali havia dezoito ou vinte homens. Eram pardos, todos nus, sem coisa alguma que lhes cobrisse suas vergonhas.
Nas mãos traziam arcos com suas setas. Vinham todos rijos sobre o batel; e Nicolau Coelho lhes fez sinal que pousassem os arcos. E eles os pousaram.
Ali não pôde deles haver fala, nem entendimento de proveito, por o mar quebrar na costa. Somente deu-lhes um barrete vermelho e uma carapuça de linho que levava na cabeça e um sombreiro preto.
Um deles deu-lhe um sombreiro de penas de ave, compridas, com uma copazinha de penas vermelhas e pardas como de papagaio; e outro deu-lhe um ramal grande de continhas brancas, miúdas, que querem parecer de aljaveira, as quais peças creio que o Capitão manda a Vossa Alteza, e com isto se volveu às naus por ser tarde e não poder haver deles mais fala, por causa do mar.
Na noite seguinte, ventou tanto sueste com chuvaceiros que fez caçar as naus, e especialmente a capitânia. E sexta pela manhã, às oito horas, pouco mais ou menos, por conselho dos pilotos, mandou o Capitão levantar âncoras e fazer vela; e fomos ao longo da costa, com os batéis e esquifes amarrados à popa na direção do norte, para ver se achávamos alguma abrigada e bom pouso, onde nos demorássemos, para tomar água e lenha. Não que nos minguasse, mas por aqui nos acertarmos.
Quando fizemos vela, estariam já na praia assentados perto do rio obra de sessenta ou setenta homens que se haviam juntado ali poucos e poucos. Fomos de longo, e mandou o Capitão aos navios pequenos que seguissem mais chegados à terra e, se achassem pouso seguro para as naus, que amainassem.
Fonte: www.sohistoria.com.br



segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

SAUDADES DE MONSENHOR MURILO

Monsenhor Murilo de Sá Barreto
Por Renato Casimiro

Alguém, em algum lugar no passado, disse com rara felicidade uma dessas expressões que ainda nos toca bem, de perto: “o Vigário do Nordeste”. Muito provavelmente, ao observador atento, tratava-se de designar alguém que ao longo de várias décadas alçara a credibilidade, manifestara a dedicação amorosa e cumprira fielmente o zelo pastoral, características marcantes dos que abrem o coração para missionar em nome do Cristo. Penso que isso, na melhor parte, sintetiza a razão de ser de Francisco Murilo de Sá Barreto entre nós. O tratamento, aplicado a quem tantos benefícios deixou na memória de seu povo, é sinal de uma honra que se confere a privilegiados dentre a sua gente. Não um tratamento burocrático, mas uma menção afetuosa e permanente entre todos os que entenderam a sua missão vivificadora.
Nesse mês, lembramos Pe. Murilo na frieza do calendário que nos faz recordar do tempo de sua ausência. Depois daquele trauma horroroso, em quatro de dezembro de 2005, esses doze anos nos fortificaram na crença da imensa felicidade que foi conhecê-lo, de tê-lo junto de nós, para receber de sua mente, de seu coração e de seus braços, parte das energias que nos promoveram a uma comunidade melhorada, mais solidária e fiel a esse desígnio de acolhida e abrigo em romaria. Não é possível descrever sumariamente o longo, proveitoso e eficiente serviço para consolidar o ciclo de Romarias de Juazeiro do Norte, a despeito das imensas reservas que ele viveu, historicamente.
 Superou-as todas e nos legou a certeza maior de que a Igreja não tardaria a reconhecer a grandeza da religiosidade do povo romeiro. Nesse sentido, e ao tempo em que nos encontramos, para recordar tantos fatos relevantes recentemente acontecidos, sempre nos ocorre a sensação de que nos lembramos desse ausente-presente, nas saudades que cada um refere, pelo amigo que se foi. Essas saudades que naturalmente sentimos em sua ausência são sinais evidentes do quanto nos fazem falta a sua palavra esclarecida, o gesto concreto e preciso para superar tantos obstáculos, a vigilância esmerada que sempre parecia nos proteger, em tanto momentos, como vimos nascer e crescer na caminhada que empreendemos para construir essa civilização sertaneja.
 Pelo exemplar serviço à nossa Igreja, e à comunidade a que foi tão e exemplarmente servidor, Pe. Murilo de Sá Barreto é alvo acrescido às nossas invocações, a situá-lo dentre os nossos santos, os credores maiores de nossas reverências, orações e crenças. Sabe disso o povo nordestino que tantas vezes foi solidário ao seu chamamento, à devoção de Nossa Mãe das Dores e aos rogos do santo padrinho do Juazeiro, fortalecendo essa vocação de missionário. Cada um de nós vai lembrar, enquanto for possível, o papel importante que cumpriu, à frente da principal paróquia desse Juazeiro do Norte. Felizmente, entronizado em nossos corações, ele é parte dessa fortaleza que nos entusiasma e que nos acalma, é parte dessa esperança que nos anima, e é parte do futuro que nos aguarda.
(Informativo Romaria, Dez., 2017)


domingo, 3 de dezembro de 2017

Cabelos côr de prata

Poeta  Rogaciano Leite
Meus cabelos cor-de-prata

são beijos de serenata
que a lua mandou pra mim.
Os meus cabelos grisalhos
são pingos brancos de orvalho
num tinteiro de nanquim.


Estes meus cabelos brancos
que hoje são da cor dos bancos
solitários de um jardim,
já sentiram muitos dedos
e ouviram muitos segredos
que elas contavam pra mim.


Se hoje, estão desbotados
é porque foram beijados
com muito amor e emoção
E os beijos foram tão puros
que os meus cabelos escuros
estão da cor do algodão.


Eu fiz tanta serenata
que a lua, desfeita em prata,
mandou mil beijos pra mim.
E os beijos foram tão puros
que os meus cabelos escuros
ficaram brancos… assim!